Publicação: 1 de setembro de 2013Categorias: Entrevistas

Maria_IvanildeCuidar de criança não é uma tarefa fácil, ainda mais quando se reúnem 80 delas, das 7h às 17h, de segunda à sexta-feira, no mesmo lugar. Esse é o retrato diário observado no Lar de Zizi, uma organização social que funciona como uma creche para filhos de mães que precisam trabalhar e não têm onde deixar os pequenos de três a cinco anos.

Localizada no bairro Luzia, em Aracaju, a instituição com mais de 50 anos de atuação conta com poucas profissionais/voluntárias que se somam na busca pela garantia dos direitos de cada criança que estuda e se diverte no local. Atividades lúdicas e regras de boa convivência se misturam ao cotidiano de meninos e meninas que encontram no Lar de Zizi motivos para sorrir, brincar e encarar a vida de uma forma mais leve.

Foto: Arquivo Lar de Zizi

A equipe do Portal Inclusão Social esteve no Lar de Zizi e conversou com Maria Ivanilde Moreira de Siqueira Prado, pedagoga com especialização em psicopedagogia que coordena a entidade desde o mês de maio deste ano. Na oportunidade, a sorridente Ivanilde relatou sobre o desafio diário de cuidar das crianças, do amor que sente pela profissão e da realidade das crianças em seus próprios lares.

Negligência, discriminação, exploração e violência são itens que estão fora da realidade do Lar de Zizi, um ambiente que cultiva o amor ao próximo e a perspectiva de dias melhores para os futuros adultos matriculados na instituição.

* Por Roseane Moura

Portal Inclusão Social – Como surgiu o Lar de Zizi?

Ivanilde Moreira – No dia 25 de outubro de 1960, Maria Moreira de Siqueira – conhecida como ‘Dona Zizi’ – fundou o Lar Infantil Nossa Senhora Santana. Após o falecimento dela, a entidade passou a ser chamada carinhosamente de Lar de Zizi, uma instituição dedicada às crianças carentes de Sergipe que eram cuidadas naquela época em regime de internato.

Portal Inclusão Social – Existe um perfil das crianças que podem ser matriculadas no Lar de Zizi?

Ivanilde Moreira – Nosso público é composto por filhos de mães carentes, como empregadas domésticas e diaristas que trabalham o dia inteiro em casas de família e não têm onde deixar as crianças. Temos crianças matriculadas dos três aos cinco anos, todos filhos de mães realmente necessitadas. Havendo vaga, a criança é matriculada caso a família se encaixe nesse perfil. Não é obrigatório que a família more aqui no bairro Luzia, pode residir em qualquer parte da cidade.

Portal Inclusão Social – Como está composta a equipe da instituição?

Ivanilde Moreira – Contamos com o trabalho de uma coordenadora, uma secretária, duas estagiárias, uma cozinheira e uma voluntária. As estagiárias são fruto de um convênio com a Prefeitura Municipal de Aracaju, enquanto as demais profissionais são pagas através das doações que chegam à instituição. É uma equipe pequena, mas que trabalha com muito amor e dedicação fazendo o que gosta. Contamos com alguns voluntários que se somam em determinados eventos/atividades, mas de fato nossa equipe necessita de mais pessoas dispostas a ajudar.

Portal Inclusão Social – Como é a rotina das crianças matriculadas na entidade?

Ivanilde Moreira – Aqui existem regras que muitas vezes as crianças não encontram em seus próprios lares. Criança precisa de limites. Então a rotina inclui momentos específicos para estudar, realizar as refeições, descansar, brincar, tomar banho etc. Os pais seguem regras também, a exemplo de deixar o filho às 7h e pegar apenas às 17h. Não podemos liberar as crianças em horários diferentes porque seguimos uma rotina diária no Lar de Zizi. O horário da saída tem que ser respeitado.

Portal Inclusão Social –No momento, que tipo de apoio a instituição necessita?

Ivanilde Moreira – Material escolar, de higiene pessoal, roupas íntimas para crianças dos três aos seis anos, brinquedos em condições de uso e pessoas que desejem se somar ao nosso trabalho como voluntárias ou ajudar financeiramente nas ações desenvolvidas pelo Lar de Zizi. São muitas crianças para poucas profissionais cuidarem. O momento mais complicado e que notamos o reduzido número de pessoal é na hora do banho diário deles [já inclui a escovação dental]. Você só consegue cuidar de crianças se tiver muito amor no coração porque é algo prazeroso mas muito cansativo.

Portal Inclusão Social – Como o Lar de Zizi procede nos casos em que a criança é desobediente?

Ivanilde Moreira – Conversamos bastante com a criança e com a família, geralmente com a mãe. Se não houver mudança no comportamento da criança, encaminhamos o caso ao Conselho Tutelar. O órgão decide como proceder com esse menino ou menina, encontrando outro local que ele possa ficar enquanto os pais trabalham. Alguns deles expressam muita violência, justamente pela realidade que observam em casa. Em alguns casos o pai está preso ou a família usa drogas. A violência psicológica e física contra algumas das crianças existe, mas fazemos o máximo na tentativa de educar e mostrar que um caminho positivo de ser trilhado é possível. Há criança que demora mais para falar o que está ocorrendo em casa ou o que está sentindo, mas conversando nossa equipe acaba compreendendo a realidade de cada aluno matriculado no Lar de Zizi. Cada um aqui tem uma história diferente para contar. A gente dá o que recebe. Muitas dessas crianças não receberam amor, carinho, afeto. Não podemos esperar que elas retribuam esses sentimentos à sociedade de forma natural. Acaba sendo algo ensinado.

# Observação: O Conselho Tutelar é um órgão público vinculado à Prefeitura Municipal de Aracaju e autônomo em suas decisões, que zela por crianças e adolescentes que foram ameaçados ou que tiveram seus direitos violados. O Estatuto da Criança e do Adolescente determina que em cada município deve haver, no mínimo, um Conselho Tutelar composto por cinco membros, escolhidos pela comunidade por eleição direta para mandato de três anos, permitida uma recondução. Toda suspeita e toda confirmação de maus tratos devem ser obrigatoriamente comunicadas ao Conselho Tutelar mais próximo da residência da vítima criança ou adolescente.

Portal Inclusão Social – Como você concilia o trabalho com a vida pessoal?

Ivanilde Moreira – Não é fácil porque também sou mãe e tenho outras atribuições além do aspecto profissional. Tenho quatro filhos, sendo um com 18 anos, outro com 17 e gêmeas de 14 anos. Gosto de participar da educação das crianças do Lar de Zizi e de contribuir na melhoria destes meninos e meninas enquanto cidadã. É uma luta diária, mas é algo envolvente. Nada melhor do que você trabalhar com o que gosta.

Fotos: Waneska Cipriano


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